Assim decidiu, por unanimidade, a Primeira Seção do STJ, no julgamento do Tema 1313 de Recursos Repetitivos (REsp 2.169.102-AL e REsp 2.166.690-RN), realizado em 11/06/2025. Do respectivo acórdão, relatado pela Ministra Maria Thereza de Assis Moura, destaca-se o seguinte:
“A questão consiste em saber se, nas demandas em que se pleiteia do Poder Público o fornecimento de prestações em saúde, os honorários advocatícios devem ser fixados com base no valor da prestação ou do valor atualizado da causa (art. 85, §§ 2º, 3º e 4º, III, CPC), ou arbitrados por apreciação equitativa (art. 85, § 8º, do CPC).
De acordo com o § 2º do art. 85 do CPC, a forma preferencial de apurar os honorários advocatícios é em percentual sobre o valor da condenação ou o proveito econômico obtido com o provimento judicial.
Nas ações que buscam prestações de saúde, a decisão judicial de procedência é condenatória: ordena o cumprimento de uma obrigação de fornecer a terapêutica (procedimento, medicamento ou tecnologia) buscada. Trata-se de obrigação de fazer ou de dar coisa incerta – dispensar medicamento, realizar exame ou intervenção, etc.
As prestações em saúde têm conteúdo econômico. No entanto, não é cabível o arbitramento com base no valor do procedimento, medicamento ou tecnologia. A prestação em saúde não se transfere ao patrimônio do autor, de modo que o objeto da prestação não pode ser considerado valor da condenação ou proveito econômico obtido. Logo, a hipótese legal preferencial – arbitramento sobre o valor da condenação – deve ser descartada.
Sucessivamente, a lei prevê que a verba deve ser arbitrada com base em percentual sobre o valor da causa. Entretanto, o § 8º do art. 85 dispõe que, nas causas de valor inestimável, os honorários serão fixados por apreciação equitativa. É nesse caso que se enquadram as ações que buscam prestações em saúde do Poder Público. Como visto, o preço da terapêutica não se traduz em proveito econômico ao postulante. O valor, alto ou baixo, do custo do procedimento, medicamento ou tecnologia buscado é uma questão importante, mas não é essencial ao conflito sub judice.
A equidade é um critério subsidiário de arbitramento de honorários. Toda a causa tem valor – é obrigatório atribuir valor certo à causa (art. 291 do CPC) -, o qual poderia servir como base ao arbitramento. Os méritos da equidade residem em corrigir o arbitramento muito baixo ou excessivo e em permitir uma padronização, especialmente nas demandas repetitivas.
Logo, o critério preferencial para o arbitramento dos honorários advocatícios em ações de saúde é a equidade, por aplicação do art. 85, § 8º, do CPC. Essa conclusão não é modificada pelas alterações promovidas pela Lei n. 14.365/2022, que introduziu os §§ 6º-A e 8º-A no art. 85 do CPC.
Isso porque, o § 6º-A impede o uso da equidade, “salvo nas hipóteses expressamente previstas no § 8º deste artigo”. Como estamos diante de caso de aplicação do § 8º, essa vedação não se aplica.
Já o § 8º-A, por sua vez, estabelece patamares mínimos para a fixação de honorários advocatícios por equidade. Os honorários seriam o maior valor entre a recomendação da tabela do Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil e o limite mínimo estabelecido no §2º. No entanto, a interpretação do dispositivo em questão permite concluir que ele não incide nas demandas de saúde. A aplicação do § 8º-A prejudicaria o acesso à jurisdição e oneraria o Estado em área sensível, na qual os recursos já são insuficientes.
Ademais, em muitas das causas, o valor da prestação buscada é elevado. O autor teria que avaliar o risco de litigar e, em caso de sucumbência, arcar com os honorários correspondentes. Isso imporia à pessoa, premida por uma situação de doença grave, a escolha entre litigar contra o Estado, arriscando a sucumbência que dilapidaria seu patrimônio, ou sofrer com a falta da prestação.
Nos casos em que o Poder Público é vencido, o estabelecimento de verbas sucumbenciais vultosas onera o Estado em setor para o qual a insuficiência dos recursos é notória. Em sua quase generalidade, as ações judiciais buscam que se abra brecha na política pública, a qual nega o acesso a determinada terapêutica, em nome do direito concreto do postulante à própria saúde. Ao direcionar os recursos para o atendimento da situação da causa, cria-se situação excepcional, a qual reduz a capacidade de custear a atenção à saúde para o restante da coletividade. Essa situação será ainda mais agravada se, além do custeio da prestação, forem adicionados honorários vultosos.
Além disso, o § 8º-A usa dois marcos como piso, os quais são estranhos à administração pública. Um deles, é o § 2º do art. 85, que não incide na condenação da fazenda pública em honorários, regida pelo parágrafo seguinte. O outro, a tabela de honorários do Conselho Seccional da OAB, a qual não se aplica aos advogados públicos e aos defensores públicos, remunerados por subsídio, na forma do art. 39, § 4º, combinado com art. 135, da CF. Logo, não há sentido em usar esse dispositivo para reger a fixação da sucumbência nas ações de saúde, quando direcionadas contra o Poder Público.
Do exposto, fixa-se a seguinte tese: Nas demandas em que se pleiteia do Poder Público a satisfação do direito à saúde, os honorários advocatícios são fixados por apreciação equitativa, sem aplicação do art. 85, § 8º-A, do CPC.”
Fonte: STJ (Informativo de Jurisprudência)
(17/06/2025)